domingo, 10 de maio de 2009

Uma Passagem


A amizade é uma das coisas mais preciosas

da vida e fica melhor ainda quando vira amor.
(Cazuza e Frejat)





Todo o dia de manhã pegava o ônibus, era janeiro, férias e eu estava livre da faculdade, mas presa o trabalho. O ônibus vinha com poucos passageiros, no primeiro dia útil de janeiro, se não me engano era dia três de janeiro de 1996, fui para o trabalho, embarquei e meus olhos o encontraram, parece clichê, mas foi como amor a primeira vista. Sentei um atrás dele, durante a viajem toda fiquei reparando no seu jeito, a viajem toda fiquei disfarçando, mas era impossível não olhar para ele, ali sentado na janela olhando as paisagens que passavam pela sua janela, por coincidência ele descia um ponto antes do meu.
Fiquei algumas semanas viajando sentada sempre próximo dele. Imaginando a sua voz, seu cheiro, seu jeito; passou janeiro, me lembro até hoje que no primeiro dia de fevereiro acordei decidida, iria me sentar com ele, o ônibus passou no mesmo horário agora já começava a vir com mais passageiros ms para minha sorte naquele dia ninguém havia sentado com ele, respirei fundo e sentei, a partir daquele dia passei a me despedir da minha timidez toda vez que embarcava no ônibus, passei a puxar papo com ele, lembro que nossa primeira conversa relâmpago foi sobre o tempo e o clima de férias, mesmo a gente tendo de trabalhar. Pela primeira vez ouvi seu timbre de voz, era lindo, envolvente suave, mas firme e seu cheiro me trazia uma sensação embriagante, poderia ficar horas viajando ao seu lado, me sentia em outra dimensão.
Nossas conversas nunca foram muito longas e nunca com um sentido. Teve um dia que estava chovendo e ele me falou suas teorias sobre o céu e o mar, o sol e a lua. Quando ele terminou eu estava assumidamente com cara de boba, não pela sua teoria fazer sentido mas sim por ver que ele conseguia ver além das coisas banais, afinal ele admirava a lua, o sol, o céu e o mar. Hoje quando me lembro caio na gargalhada, quando lembro de suas teorias.
Ficamos amigos, confesso que além de amizade tinha algo a mais que sentia por ele, não sei explicar, mas sentia falta quando ele não vinha, ou quando um dos dois perdia o horário, ele passou a se tornar uma droga diária, eu necessitava de suas doses. Fevereiro passou e ele também, não, não esqueci ele, mas no dia 28 de fevereiro de 1996, meu ônibus atrasou, quando embarquei nem me preocupei em perguntar o porque do atraso, procurei por ele e ele não estava, viajei sozinha, quase que em crise de abstinência, passei a viajem inteira agoniada, quando desci perguntei ao motorista o porque do atraso e o motorista me disse com os olhos embargados que o moreno que sentava comigo, todos os dias, havia se atrasado para pegar o ônibus e na pressa de atravessar a rua, foi atropelado por um caminhão. Fiquei sem reação, sem chão; ele se foi e passei a viajar sozinha novamente, sempre sentada no mesmo lugar que sentávamos todos os dias, busca ali naqueles dois bancos, resquícios de uma pessoa que passou a ser necessária pra mim.

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